2018-7-19
Gestores de um hospital de Londres, o psiquiatra Amar Shah e o diretor financeiro Steven Course publicaram este mês um estudo sobre um novo modelo para elaboração de projetos de qualidade em saúde.
O desafio de implantar projetos de melhoria da qualidade costuma ir além de encontrar novas e mais eficientes maneiras de realizar procedimentos do dia a dia das instituições de saúde.
Além de motivar a equipe que está na linha de frente, é fundamental convencer quem toma as decisões e dá a chancela para a execução de novos projetos. Não bastam bons argumentos: é preciso também falar a mesma linguagem.
O psiquiatra Amar Shah e o farmacêutico Steven Course depararam com esse desafio à frente do departamento de qualidade e financeiro, respetivamente, do East London NHS Foundation Trust (ELFT), um hospital psiquiátrico e cuidados básicos em Londres. Perceberam que era preciso demonstrar que o aprimoramento da qualidade pode resolver problemas complexos que são prioridade para os gestores. Traduzindo em poucas palavras: como a qualidade afeta os custos. “Não há muita literatura para demonstrar o retorno que podemos ter como organização ao investir em aprimoramento da qualidade”, afirmou Shah, durante sua apresentação no Fórum Internacional de Segurança e Qualidade em Saúde, que aconteceu em abril, em Amesterdão.
Para resolver esse problema, Shah e Course desenvolveram um modelo para demonstrar aos gestores das organizações o quantificar o retorno de cada projeto de qualidade (a). Este modelo foi publicado no Future Healthcare Journal.uma publicação do Royal College of Physicians.
Shah considera que o segredo é conjugar qualidade e custo, transformando o custo da qualidade em valor. Frequentemente, parece que os esforços para melhorar qualidade estão completamente separados da maneira como se administram os custos. É precisamos pensar de maneira a que que coloquem as duas coisas juntas.
Shah e Course basearam-se em modelos de grandes especialistas de gestão da qualidade, como o japonês Noriaki Kano, que enfatiza a satisfação do consumidor, e do radiologista americano Stephen J. Swensen, que se tornou uma referência com o seu trabalho em qualidade na Clínica Mayo. Recomendam que se estabelecem pilares centrais a serem levados em consideração no desenvolvimento de um projeto.
Três questões norteiam a filosofia de Kano, hoje professor emérito na Universidade de Tokyo e que desenvolveu o seu modelo nos anos 80, não especificamente para a saúde:
1) é possível eliminar problemas de qualidade que surgem porque as expectativas dos clientes não são supridas?
2) é possível reduzir custos significativamente e manter ou aumentar a qualidade?
3) é possível expandir as expectativas dos clientes ao fornecer produtos e serviços que normalmente não são valorizados?
Já a abordagem de Swensen (b) estrutura os projetos em quatro categorias:
A) melhora da experiência dos clientes (os pacientes),
B) benefícios para a reputação da organização
C) efeitos sobre a equipe, a cultura organizacional e o orgulho de fazer parte dela (a que se refere pelo termo em francês “esprit de corps”)
D) retorno financeiro.
O novo modelo de Shah e Course criou um híbrido dos dois anteriores, na tentativa de deixá-lo mais completo. Recomendam descrever e apresentar um projeto de gestão da qualidade em saúde dividindo-o em seis níveis de impacto:
— 1º) Experiência do paciente: mostre quais são os benefícios para a atividade-fim. Esse nível de impacto alinha-se totalmente ao propósito central do negócio, por isso, ele muito importante: são os benefícios para os pacientes, os prestadores de cuidados e a família (a quem servimos). Trata-se da redução de úlceras de pressão, redução de medicações não tomadas pelos pacientes, melhorar a satisfação dos pacientes etc….
— 2º) Equipe: explique os benefícios sobre o trabalho dos funcionários. É importante mostrar o projeto reforçará o sentimento de autonomia, de fazer a diferença, além de conectar a equipe aos propósitos da organização. Isso favorece laços fortes e coesos.
— 3º) Produtividade e eficiência: Repensam a conduta antiga, e analise como fazer mais com menos. Gera um grande impacto . Um exemplo é estudar o fluxo de entrada dos pacientes para acelerar o atendimento, pode libertar capacidade sem precisar fazer investimentos.
— 4º) Novos custos: apresente o impacto de evitar o problema que o projeto envolve. São os benefícios para evitar custos que não foram planeados, invisíveisnuma primeira análise. Estime os custos de lidar com cada evento adverso ou variável que está a procurar resolver.
— 5º) Custos antigos: demonstre como o projeto libera capacidade/recursos usados sem necessidade. Esse é o nível que todos se lembram de mostrar na hora de fazer o projeto. Qual é o custo já previsto que o projeto elimina no sistema?
— 6º) Receitas: explique como melhora a imagem para poder atrair novos negócios e oportunidades de receitas. Esse benefício confere uma vantagem competitiva. Se a organização conseguir mostrar que é um prestador de serviços de alta qualidade, pode atrair negócios. O projeto pode, inclusive, criar novas fontes de receitas, ao exportar know-how e treino para outras instituições.
O autores alertam de que é preciso pensar num portfólio de projetos, para criar um equilíbrio. Nem todos cortarão inteiramente custos já existentes. A maior parte dos impactos costuma ser como evitar custos futuros, não sobre libertar fundos de maneio – mas esses impactos sobre libertação de fundos também existe, só que em número menor.
Para criar esse portfólio diversificado de projetos, o ideal é pedir para cada setor da instituição identificar potencial para redução de custos. As áreas que costumam ser boas candidatas são aquelas em que o custo é alto e não há processos bem definidos: vai gastar-se pouca energia para conseguir bons rendimentos. Por isso, é fundamental mapear os custos das áreas e fazer diagramas de processos, para entender onde há espaço para melhorias.
Par mais informações sobre este tema consultar:
(a) Shah, Amar; Course, Steven. Building the business case for quality improvement: a framework for evaluating return on investment future. Hosp J June (2018) 5:132-137; doi:10.7861/futurehosp.5-2-132sen:
(b) Swensen SJ, Dilling JA, Mc Carty PM, Bolton JW, Harper CM Jr. The business case for health-care quality improvement. J Patient Saf. 2013 Mar;
9(1):44-52. doi: 10.1097/PTS.0b013e3182753e33.
Fonte: IBSP- Instituto Brasileiro para a Segurança do Paciente/Marcela Buscato