O JornalDentistry em 2016-12-26
Quando nos chega à mente a palavra ‘dentada’ surgem duas conotações imediatas: ou o reconhecimento de um dos momentos presentes no ato de alimentação como, por exemplo, trincar um pastel de nata ou a definição de uma ação de agressividade como aconteceu na famosa mordedura de Mike Tyson à orelha de Evander Holyfield.
No entanto, existe ainda uma outra pseudo-dentada bastante frequente que merece ser lembrada.
São várias as pessoas que, em momentos de extrema alegria e felicidade, descrevem o desejo espontâneo de cheirar ou mesmo morder de forma carinhosa um objeto, um cão pequeno ou um bebé recém-nascido. E a verdade é que, de acordo com uma investigação antropológica recente, na qual foram realizadas imagens de ressonância magnética em mulheres que colocavam a sua face junto à de bebés recém-nascidos, os odores libertados ativavam áreas do cérebro relacionadas com a recompensa e o prazer, tal como acontece com os alimentos. Aparentemente, o cérebro parece responder de forma similar quando se procura comida ou se depara com algo atraente e bonito, tornando-se esta “dentadinha de amor” numa experiência psicológica desta sobreposição fisiológica.
É muito provável que esta “mordida social” faça parte da nossa herança evolutiva. Alguns macacos, por exemplo, alinham-se à espera da oportunidade de lidar com a nova cria e, perante o primeiro contacto, uma das primeiras ações que realizam
é precisamente esfregar o nariz e a boca de forma carinhosa e amigável. Ademais, para além da questão sexual, todos os mamíferos começam a sua vida dessa forma. Apesar da ausência de dentes nos primeiros meses de vida, a extração de leite
das glândulas mamárias das progenitoras pode ser considerado em si mesmo já como um ato de entusiasmo social.
Com o dia de Natal aí tão perto, já se começam a multiplicar as imagens das queridas tias a querer dar pequenas “mordidelas” nas bochechas das crianças mais pequenas. Os pais normalmente não gostam de ver e os infantes ainda menos de sentir. Contudo, depois desta explicação, fica a sugestão de que não se volte a observar este ato de forma tão bizarra. Estas “dentadinhas de amor” afinal não são mais do que um instinto primitivo recheado de boas intenções.
Texto: Fernando Arrobas, médico dentista
fernando.arrobas@jornaldentistry.pt
Ilustração: Diogo Costa
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